'Cargueiro da vergonha': ONGs europeias denunciam embarque de armas para o regime Saudita

'Cargueiro da vergonha': ONGs europeias denunciam embarque de armas para o regime Saudita


Alerta foi dado por 17 ONGs que denunciaram a chegada prevista ao porto de Cherbourg, na Normandia, do cargueiro Bahri Yanbu. O navio é suspeito de ter vindo à Europa buscar armas de fabricação francesa que seriam usadas no Iêmen. O cargueiro Bahri Yanbu no porto de Cherbourg, na Normandia, na quinta-feira (6)
Lou Benoist/AFP
O alerta foi dado por 17 ONGs que denunciaram nesta quinta-feira (6) a chegada prevista ao porto de Cherbourg, na Normandia, do cargueiro Bahri Yanbu. O navio é suspeito de ter vindo à Europa buscar armas de fabricação francesa que seriam usadas no Iêmen.
A embarcação está sendo chamada de “cargueiro da vergonha”. As organizações chamam atenção para crimes de guerra cometidos pela Arábia Saudita no Iêmen e pressionam por mais transparência nos contratos de venda de armas.
“Vendas ilegais de armas, não no meu porto” dizia um dos cartazes levados pelos manifestantes. “Crimes de guerra no Iêmen: 230 mil vidas”, lia-se em outra faixa.
“A Arábia Saudita participa de um conflito sem piedade ao povo iemenita, perpetrando atrocidades contra uma população sem defesa. Nós não podemos aceitar que o porto de Cherbourg possa servir a esse conflito”, afirmam as organizações não governamentais em um comunicado.
O navio saudita era esperado nesta tarde no porto localizado no extremo norte da península de Cotentin, na costa do Canal da Mancha, no noroeste da França. As associações denunciam o risco de cumplicidade da França nos crimes de guerra se o país continuar a vender armas para a Arábia Saudita, líder de uma coalizão armada no Iêmen, desde 2015.
“Esse cargueiro é fretado por uma companhia que comumente trabalha com a Arábia Saudita, com o transporte de material militar. Já transportou, por exemplo, canhões franceses, ou material canadense e belga. Então, vemos bem como toda a cadeia logística e do frete marítimo pode ser envolvida pelo comércio de armas para países sobre os quais temos motivos suficientes para pensar que cometem crimes de guerra”, disse Tony Fortin, representante do Observatório de Armamentos (Obsarm) à RFI.
Para o Obsarm, o problema é a falta de transparência. Segundo o grupo, os parlamentares franceses não têm controle sobre os contratos de armas e cooperação militar da França.
“É impossível, hoje, para os deputados exercerem a sua missão de controle da atividade governamental da maneira como a Constituição exige. Segundo a lei, os cidadãos e os parlamentares deveriam estar a par da política francesa em matéria de venda de armas e cooperação militar, mas não é o caso atualmente. Ao contrário do que ocorre em outros países, como o Reino Unido ou a Alemanha”, explica Tony Fortin, do Obsarm.
“A transparência deveria reger, também, as trocas de tecnologia e treinamentos, formação militar. Para poder, num momento de necessidade, agir na fonte, não quando as armas estão sendo transportadas, mas, sobretudo, quando os contratos de armas são decididos”, completa.
“É preciso que haja uma mobilização maior dos parlamentares sobre o assunto, mas, também, que o Executivo aceite uma reforma do sistema de controle das exportações, para que possamos saber o que a França entrega, a que país, e que possa haver um debate mais frequente no Parlamento”, sugere.
Um comunicado assinado pelos partidos Socialista, a França Insubmissa (esquerda radical), Europa Ecologia e o partido Comunista, além de vários sindicatos, fez um apelo. “A França faz parte dos cinco países que mais vendem armas. É nosso papel como cidadãos de intervir para proibir esse comércio”, afirmaram conjuntamente.
Belgas bloqueiam comércio de armas a sauditas
No mesmo dia em que a chegada do navio provoca reações, a região belga da Valônia informa que não venderá mais armas ou equipamentos militares à Força Aérea saudita por causa do conflito no Iêmen.
“Com o drama iemenita em mente, a Valônia recusa-se a conceder licenças à Força Aérea saudita que desempenha um papel ativo no conflito”, escreveu o ministro Elio Di Rupo em comunicado à imprensa. “A proibição é estendida a todo o ministério da Defesa saudita”, acrescenta.
No entanto, a Guarda Real e a Guarda Nacional do reino saudita continuarão se beneficiando das entregas. “Essas armas destinam-se estritamente a proteger membros da família real (a guarda real) e locais religiosos emblemáticos ou a proteger o país (a guarda nacional) dentro das fronteiras da Arábia Saudita. Elas não se destinam a ser usadas no Iêmen “, argumenta a região belga de língua francesa.
Na Bélgica, a atribuição de licenças de exportação aos fabricantes de armas é uma competência do Executivo das regiões (Flandres, Valônia e Bruxelas).
Segundo o jornal belga “L’Echo”, Riad tornou-se o primeiro cliente da Valônia neste mercado, com vendas estimadas em € 225 milhões, em 2018.
A Liga dos Direitos Humanos (LDH) celebrou “o compromisso assumido para o futuro”, mas lamentou a falta de transparência nas licenças atuais. “Uma licença é válida por 18 meses. Não sabemos até que ponto as que já foram concedidas expiraram ou foram sujeitas a renovação”, explicou Manuel Lambert, consultor jurídico da LDH.
A decisão do ex-primeiro-ministro socialista belga (2011-2014), que se tornou presidente da Valônia em meados de 2019, chega em um momento em que a presença no canal da Mancha da transportadora saudita Bahri tem irritado ONGs da França e da Bélgica.
Na Bélgica, a empresa Bahri é suspeita de zarpar regularmente para a Antuérpia a fim de carregar armas empregadas no conflito do Iêmen. Várias ONGs já entraram com processos na Justiça na tentativa de suspender essas entregas.
Os fabricantes de armas da Bélgica são originários, essencialmente, da Valônia. A empresa CMI, em Liège, e a FN Herstal – da qual a região é a única acionista – empregam, juntas, 4.400 pessoas, direta ou indiretamente.
Desde 2015, a guerra no Iêmen, na qual Riad combate forças rebeldes, já matou dezenas de milhares de pessoas, principalmente civis, de acordo com várias organizações humanitárias.
Fonte: MUNDO

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