Risco maior é o pânico


Desinformação se espalha mais rápido que o novo coronavírus e dificulta contenção da epidemia Passageiros chegando a Nairóbi, no Quênia, são testados para o novo tipo de coronavírus ao chegar de Changsha, na China, nesta quarta-feira (29/1)
Patrick Ngugi/AP
O comitê de emergência da Organização Mundial da Saúde se reúne hoje em Genebra para decidir se considera “emergência global” a epidemia da nova variante do coronavírus que se espalhou nos últimos dias a partir da cidade de Wuhan, na China (chamado 2019-nCov).
Com 170 mortes num total de 7.783 casos registrados até ontem (2,2%), o 2019-nCov tem se revelado menos letal que a variante responsável pela epidemia de Síndrome Respiratória Aguda (Sars), que matou 774 dos 8.098 infectados (9,6%) em 2003. Em compensação, o novo vírus parece tão contagioso quanto a variante anterior. O fato de matar menos pode contribuir para que se espalhe mais, já que ele fica incubado entre 6 a 14 dias nos infectados, sem sintomas aparentes.
O Ministério da Saúde anunciou ontem que há pelo menos 9 casos suspeitos sob investigação no Brasil, nenhum deles confirmado. Companhias aéreas suspenderam voos para a China, e a vigilância foi reforçada em portos e aeroportos. Medidas básicas de higiene e isolamento dos infectados, já adotadas no caso da Sars, poderão funcionar para conter a epidemia.
O principal fator que tende a dificultar o trabalho dos profissionais de saúde é a desinformação. Por enquanto, apesar de casos suspeitos já terem sido confirmados em mais 19 países, o grosso se concentra na China. É lá que estão 98,7% dos 7.783 infectados até ontem. Só a província de Hubei, onde fica Wuhan, concentra 59%. Fora da China foram detectados apenas 105 casos. Nenhum deles resultou em morte.
Embora as autoridades chinesas tenham demorado a reconhecer a extensão da ameaça e demorado para agir (leia mais aqui), as medidas de quarentena e inspeção deverão começar a surtir efeito nos próximos dias. No caso da Sars, o mecanismo levou algumas semanas para demonstrar eficácia, mas funcionou.
A opacidade do governo chinês para lidar com o risco desde o aparecimento dos primeiros casos, em dezembro, contribuiu para despertar uma onda de boatos. Eles têm se espalhado pelas redes sociais e sites de reputação duvidosa com velocidade bem maior que o próprio vírus. Entre as teorias da conspiração mais disseminadas, estão as que atribuem o desenvolvimento do vírus a um laboratório militar chinês ou a cientistas canadenses, além de gráficos falsos, fabricados para exagerar o risco (o G1 publicou um guia do que é #FATO ou #FAKE).
Tudo isso contribui apenas para disseminar o pânico numa situação que, embora preocupante, está longe de oferecer risco comparável ao de epidemias devastadoras, como a gripe espanhola do início do século XX ou a peste bubônica na Idade Média. Ainda que a OMS declare a situação de emergência, o pânico não ajuda em nada o combate ao coronavírus.
Apesar de ter superado a Sars em velocidade de contágio, o novo vírus tem sido menos letal, em especial entre as crianças. Uma hipótese é que alguma vacina comumente aplicada na infância também ofereça proteção indireta – ideia usada para acelerar pesquisas de uma vacina contra o 2019-nCov. Boa parte dos pacientes que morreram estava sujeita a outras infecções ou doenças.
O impacto mais garantido da epidemia de coronavírus será econômico. As medidas de controle da epidemia isolaram pelo menos 56 milhões de chineses, numa região que funciona como entroncamento na rede de transportes e centro de produção industrial, com fábricas da Nissan, Honda e General Motors, além da maior fabricante global de cabos para redes de comunicacão.
A província de Hubei, praticamente paralisada, é responsável por 4,5% do PIB chinês, cujo crescimento já tem deixado a desejar. Na época da epidemia de Sars, a China respondia por apenas 4% da economia global. Hoje são 16%. Não é à toa que as bolsas e mercados financeiros tenham sofrido um baque.
As indústrias de turismo e entretenimento estão entre as mais afetadas. Centros como Xangai e Cantão estenderam o feriado do Ano Novo Lunar como medida de precaução. Fábricas e lojas permanecem fechadas. A retomada plena das atividades está prevista apenas para 10 de fevereiro. Até lá, os riscos estarão mais claros, e a epidemia, assim esperemos, poderá ter sido contida.
Fonte: MUNDO

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